Se eu fosse eu aos 40 anos

Nos últimos dias têm ecoado em mim ideias de um texto de Clarisse Lispector em que a escritora, com o pretexto de encontar uns papeis que guardou, coloca a hipótese: Se eu fosse eu onde teria guardado estes papeis?
Daí, Lispector entra numa divagação sobre o que acontece quando eu sou REALMENTE eu. Decidir sempre com fidelidade ao que penso é o pressuposto.
Assustadoramente tenho-me sentido cada vez mais eu, e parece-me que já serão os ventos anunciadores dos 40 anos que farei na primavera. O aspecto positivo é que em vez de confronto e gritaria, este eu mais eu cala, fecha, guarda e tem, pasme-se, até mesmo a capacidade de ignorar. Se eu pudesse dizer isto ao meu eu de 20 anos ele nunca acreditaria.
Não há aqui perfeição porque me defino como uma saca de inquietações.
Esta crise dos 40, que eu nunca pensei viver, não é pela negativa. Não se centra em achar que o resultado dos quase 15 mil dias vividos não é o desejado. A crise está em não poder e não querer que daqui para a frente algum dos dias que venha a viver seja desperdiçado. É desejar o simples, o que foca, o que concentra o essencial, o que selecciona.
A exigência está na realização e na resposta às perguntas: quero? faço-o porquê? vale pena?o que deixo de fazer para seguir com esta opção?consequências disto?