Consciência

Há muito que a ideia de consciência me inquieta, em especial a consciência moral, o grilo falante do pinóquio que todos, ou quase todos, temos . Interessa-me a forma como surge? Como se desenvolve nas crianças e adolescentes? E porque assume formas tão distintas em algumas pessoas, e ao mesmo tempo tão semelhantes para a a maioria. Deixando de lado a religião, o castigo do inferno e o benefício do usufruto do céu. Esta curiosidade levou-me a ler António Damásio no seu livro O Sentimento de Si e apresento as ideias que me surgiram dessa prazerosa demanda.
No livro o autor dá pistas para compreender a consciência – corpo, à emoção e à neurobiologia – de que seleccionei as que a seguir apresento. A seleção tem a ver com interesses que tenho e a interpretação que faço.
A consciência pode ser definida como a percepção que o organismo tem do seu próprio ser e do seu ambiente. É a existência de consciência que permite a evolução humana numa nova ordem de criações como a moral, a religião, a organização social e política, as artes, as ciências e as tecnologias.
Ter consciência permite sentir tristeza, alegria, dor ou prazer, vergonha, orgulho, chorar e amar. Assim, estar consciente não é o mesmo que estar acordado (vigil), ainda que por vezes no discurso comum haja esta confusão.
Para compreender melhor isto há que perceber o substrato cerebral do sentir através de duas questões. Como é que o cérebro cria a imagem do objeto? Com padrões mentais o cérebro produz paralelamente o sentido de si no ato de conhecer o objecto?
A presença de si, a consciência, é o que acontece quando o ser é modificado pela ação de apreender alguma coisa. A mente altera-se alterando o cérebro, que por sua vez nos molda o comportamento. Mente, cérebro e comportamento vão-se alterando mutuamente. É possível relacionar os processos de consciência com a operação de regiões e sistemas específicos do cérebro, assim, a consciência não pode separar-se da emoção e ambas estão ligadas ao corpo
Deve ainda ter-se em conta que a consciência não é homogénea divide-se em espécies simples e complexas. A mais simples é a consciência nuclear que é estável ao longo da vida e dá sentido de si ao organismo, ao aqui e agora, e é comun aos vários seres vivos, e não exclusiva do ser humano. A mais complexa , por sua vez, é a consciência alrgada que tem vários niveis e vários graus, implica um elaborado sentido de si no que toca á ientidade da pessoa, e apenas os seres humanos a têm no seu grau mais complexo. Esta consciência complexa evoliu ao longo da vida e depende da trajetória sendo reforçada pela linguagem.
É sobretudo o desenvolvimento desta consciência alargada e complexa que me interessa, especialmente a forma como é criada e promovida pela construção da identidade e da linguagem nos adolescentes.
A consciência alargada tem no entanto base na consciência nuclear, ou seja, só se consegue ter sentido de si autobiográfico porque se sistematizaram memórias criadas pelo si nuclear. Nesta medida, é também do meu interesse a consciência nuclear como um sentido de si nuclear transitório recriado por todos os objetos com que se vai interagindo para compreender o desenvolvimento da consciência nos adolescentes. Dessa forma, há que ter em conta o processo base da consciência para explicar o fenómeno simples e fundamental na base da representação não consciente do organismo.
A consciência, enquanto sentido de si, é mais do que dar atenção a uma imagem do objeto, mais até do que uma atenção muito dirigida. Ter um sentido de si é necessário para o conhecimento que influencia todo o processar do que se vai conhecendo. Na busca do si o organismo onde a consciencia acontece e o objecto que se dá a conhcer no processo de consciência relaionam-se ao longo das interações naturais. O organismo é modificado por essa relação.
Os padrões e as imagens necessários ao aparecimento da consciência são deputados cerebrais do organismo, do objecto e da relação entre os dois. Os deputados do objeto têm mais liberdade no jogo de relações de consciência em que o objeto é mostrado sob a forma de padrões neurais para cartografar as suas caraterísticas. Os deputados do organismo, por sua vez têm menos liberdade e permitem cartografar o corpo a partir de mapas relativamente predefinidos porque há poucas modificações limites para que o corpo possa sobreviver.
Tal acontece porque o organismo tem cérebro que,por sua vez, tem um “modelo de funcionamento” desse mesmo organismo. O que permite o alicerçar da consciência, ou seja percepção/conhecimento muito além da regulação vital mas que está ligada à manutenção da vida.
Agora que temos pistas para compreender melhor a forma como funciona a consciência, deve haver lugar a perceber para que serve esta. Uma das suas funções é permitir maximizar a manipulação efetiva de imagens ao serviço de interesses de 1 organismo, no que parece ser uma função de autoproteção. Outra função é permitir ligar o santuário interior da regulação da vida à capacidade de manipular imagens que representam coisas e acontecimentos de dentro e de fora do organismo, com vantagem de prever ou planear com base na manipulação de imagens na mente. Esta segunda função leva a respostas informadas por uma preocupação mental com a própria vida do organismo.
A consciência é no entanto diferente da consciência moral que tanto me interessa, já que estar consciente é conhecer, e ter consciência moral implica noções de bem e e de mal presentes nas ações e nos objetos.
A leitura de Damásio levou-me a um releitura de Savater, no seu Ética para um Jovem, que já tinha lido em 1999 e de que aqui deixo duas ideias sobre a consciência moral: “O contrário de se ser moralmente imbecil é ter-se consciência”; e a “consciência é fundamentalmente: Saber que nem tudo vem dar ao mesmo porque queremos realamente viver e, além disso, viver bem, humanamente bem; Estarmos dispostos a prestar atenção para vermos se aquilo que fazemos corresponde ou não ao que deveram queremos; À base de prática, irmos desenvolvendo o bom gosto moral, de tal modo que haja certas coisas que nos repugne espontaneamente fazer (por exemplo, termos “nojo” de mentir como temos em geral nojo de mijar na terrina da sopa que vamos comer a seguir…);renunciarmos a procurar argmentos que dissimulem o facto de sermos livres e portanto razoavelmente responsáveis pelas consequências dos nosso atos.
Por fim, deixo a ideia de que a consciência se inicia quando os cérebros conquistam o poder de contar uma história sem palavras através dos sinais do corpo, seja ou não uma ideia com conotação positiva e negativa que a moral exige.